terça-feira, 3 de agosto de 2010

Diáspora

Conheci o Mussa há três ou quatro dias num jogo de futebol entre emigrantes em Almería. Fazia parte da assistência ruidosa que se apinhava debaixo de um telheiro, jogando às cartas ou às damas enquanto o jogo nao começava. O jogo era a final de um torneio organizado pela comunidade emigrante de Roquetas del Mar, e o motivo a inauguraçao de um campo pelado construído pelos próprios emigrantes num terreno cedido pelo "ayuntamiento".

A maioria da assistência era senegalesa porque as duas equipas que chegaram à final representavam as duas maiores tribus do país: os Wolof e os Peul.
O nosso grupo dispersou-se pelo telheiro e pelas bancadas do lado oposto (nascente), onde um "soundsystem" debitava música "zouk" em altos decibéis enquanto os adeptos iam ocupando os lugares.

O grupo que conversava ao meu lado resolveu satisfazer a curiosidade perguntando-me quem eramos e o que estávamos ali a fazer. Quando eu disse que era português, o rosto de um deles iluminou-se. Estendeu as maos na minha direcçao e apresentou-se: "o meu nome é Mussa, sou da Guiné Bissau!".

Começou a falar-me em português, o volume da voz um pouco mais alto do que antes. Olhava em redor enquanto falava, orgulhoso da relaçao privilegiada que acabava de estabelecer com o forasteiro. Apresentou-me dois dos atletas que se preparavam para entrar e que se queixavam que os locais eram um pouco "caceteiros". Quando lhe perguntavam que idioma estávamos a usar, respondia "Português!", como se fosse dono de um pequeno tesouro.

Perguntei-lhe se já tinha estado em Portugal. "Nunca, mas os meus pais e um dos meus irmaos vivem lá. Em Lisboa. Eu gostava de ir. Gostava de ver um jogo do Benfica."
Desta vez foi o meu rosto que se iluminou. Dei-lhe um novo aperto de mao e puxei da carteira para lhe mostrar o Red Pass e o cativo de 2004-2005 assinado pelo Simao.

Contou-me que conhecia o Carlitos, o que jogava nos juvenis. Eram vizinhos em Bissau. Contou-me como acompanhava os resultados e como sofria com o Glorioso. Contou também como tinha festejado há cinco anos em Bissau, antes de arriscar a vida metendo-se num barco com mais 36 senegaleses para fugir à fome e ao caos do seu país, rumando a Espanha numa arriscada viagem de 7 dias.

Contou-me, por fim, como tinha festejado sozinho este ano. "Qual Real Madrid? Qual Barça? O Benfica é que é o maior clube do mundo!"
Nao duvides Mussa. Nao duvides. O Benfica é o maior clube do mundo, e tu és a prova dessa grandeza.

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